quarta-feira, 14 de dezembro de 2016

Reconhecendo nossa Cidadania Italiana

Minha mãe é neta de imigrantes italianos, que em decorrência da crise e fome na Itália vieram para o Brasil há 120 anos atrás, em busca de uma vida melhor.
Meus trisavós Luigi Caramel e Giovanna Pasin viviam na região do Vêneto, norte da Itália, na província de Treviso, numa cidade chamada San Biagio di Callalta, localizada a poucos quilômetros da cidade de Veneza. No início do ano de 1897 embarcaram para o Brasil num navio chamado San. Gottardo, juntamente com seus 5 filhos:  Angelo (17 anos, meu bisavô), Giacomo (12 anos), Teresa (9 anos), Giovanni (7 anos) e Gugliemo (5 anos). Chegaram ao porto de Santos no dia 08 de fevereiro de 1897 e após algum tempo na cidade de São Paulo seguiram para regiões agrícolas do interior de São Paulo.

Na cidade de Jaguariúna, meu bisavô Ângelo conheceu uma italiana chamada Santina Maffei, filha de Giovanni Battista Maffei e Catherina Chiodini, imigrantes da cidade de Albano Sant´Alessandro, província de Bérgamo, a 65 km da cidade de Milão, também norte da Itália. Da união de Angelo Caramel e Santina Maffei (meus bisavós), nasceram 8 filhos: Dino, Ideo, Adílio, Elvira, Ernesto (meu avò), Danilo, Aduílio e Otília, esta última falecida aos 13 anos de idade.

Meu avô Ernesto Caramel se casou com Luiza Campos Gentil, filha de Gabriel Campos Cobo (nascido na Espanha) e Regina Gentil Hespanha, filha de imigrantes italianos. Da união dos meus avós nasceram 6 filhos: Senizio, Izalina (mina mãe), Izaíde, Sinezio, Ivaneide e Seniro.
Meus avós se casaram na cidade de Sabino, próximo à cidade de Lins, interior de São Paulo. Nesta cidade nasceram os 6 filhos e lá  viveram o restante de suas vidas. Meu avô Ernesto faleceu em 2001 e minha avó Luíza a poucos meses atrás, em setembro de 2016.
Minha mãe se casou com Alípio Costa Santos, nascido no estado da Bahia e filho de Joventino Costa Santos (descendente de escravos) e Maria Laurinda de Jesus, de ascendência portuguesa. Da união dos meus pais nasceram 3 filhos: eu, Lidionete a mais velha, depois minha irmã Midia e meu irmão caçula Ezequias.
No ano de 1993 me casei com Fernando Portinari de Souza e temos 3 filhos: Bruno, Davi e Vitor.
Não conheci minha avó paterna, pois já era falecida quando nasci e tive pouco contato com meu avô paterno Joventino, que faleceu na minha infância, portanto meu contato maior sempre foi com meus avós maternos Ernesto e Luiza, pois desde criança ia visita-los e tenho as melhores recordações.

Década de 1980, férias no sítio da família em Sabino

Amava passear de charrete com a vó Luiza

Meu avó Ernesto sempre foi um homem muito sábio e eu passava horas ouvindo as suas histórias. Apesar dele ter nascido no Brasil, era um italiano de coração e sangue, pois tanto seu pai quanto sua mãe eram italianos natos. Ele contava muitas coisas e eu sempre com papel e caneta para anotar e registrar. Dessa forma cresci tendo um grande interesse e curiosidade pela Itália, sua cultura, comida, costumes, etc.
Foi em 2005 que eu soube da possibilidade de requerer a cidadania italiana por direito de sangue e comecei a me informar e desbravar a história da família. No início parecia que não iria conseguir, pois eu não sabia a cidade de nascimento do antenato italiano, pois meu avô dizia que o pai dele tinha nascido em Treviso, que é a província, mas em qual das 95 cidades (Comuni) pertencentes a Treviso? Minha estratégia inicial foi remeter cartas a cada um desses Comuni, perguntando se a certidão de nascimento do meu bisavô se encontrava lá...  E as respostas começaram a chegar, todas negativas. Mas alguns Comuni não responderam, o que gerou a dúvida se meu bisavô tinha ou não nascido lá...
No final do ano de 2007 passamos pela maior prova da nossa vida, quando nosso filho Vitor foi diagnosticado com tumor cerebral e parei com as pesquisas de genealogia, pois as prioridades eram outras.
O tempo foi passando e com a situação do Vitor sob controle, no final de 2014/ início de 2015 voltamos a pensar nessa questão da documentação para requerer cidadania italiana e retomei as pesquisas. Graças a Deus na certidão de casamento dos meus bisavós constava a cidade de nascimento de ambos e foi aí que descobri que meu avô Ângelo tinha nascido em San Biagio di Callalta, província de Treviso.
A Itália possui mais de 8000 Comuni (prefeituras) e muitas vezes descobrir em qual deles nosso antenato nasceu é uma dificuldade, pois nem sempre as certidões brasileiras de casamento e óbito mencionam este dado... Na maioria das vezes vem escrito “Fulano de tal nascido na Itália” ou “Fulano de tal nascido na província de Treviso”, por exemplo, mas em qual das 95 cidades da província de Treviso?
Após a descoberta do local de nascimento do meu bisavô, o próximo passo foi solicitar a certidão de nascimento italiana e inicialmente fiz o pedido por carta e também por e-mail, mas sem sucesso de resposta, nem que sim e nem que não. Cheguei até pensar que os arquivos tinham sido destruídos na primeira guerra mundial, tendo em vista o local ser bem próximo de onde acorreram muitos bombardeios.
No ano de 2012 visitamos a cidade, quando viajamos para a Itália, mas como era final de semana, nem fomos à prefeitura (Comune) buscar a certidão...
Após aguardar e não chegar resposta, meu filho Bruno teve a ideia de contratar uma pessoa para ir pessoalmente no Comune e retirar a certidão, o que deu certo e então pudemos enfim montar nosso processo para dar entrada no pedido de reconhecimento da cidadania italiana.
Com a documentação italiana em mãos, fomos em busca das certidões brasileiras de nascimento, casamento e óbito, em inteiro teor, de todos da linha de transmissão. Nesse processo tivemos sorte, pois as certidões estavam corretas e sem erros, o que não acontece na maioria dos casos. Quando há erro em nomes, sobrenomes, data ou local de nascimento é necessário retificar, o que pode demorar.
Em menos de 60 dias estávamos com as certidões em mãos e o próximo passo foi solicitar a CNN (Certificado de Não Naturalização) junto ao Ministério da Justiça, que é uma comprovação de Não Naturalização do estrangeiro, pois para transmitir o direito à cidadania o italiano não pode ter se naturalizado brasileiro, pelo menos não antes do nascimento dos filhos. Com a CNN negativa e em ordem, foi o momento de traduzir todos os documentos para o italiano e depois legaliza-los no ERESP, o Escritório de Representação em São Paulo do Ministério das Relações Exteriores. Com toda essa parte pronta, o próximo passo foi agendar a legalização junto ao Consulado italiano em São Paulo, que até o dia 15 de agosto de 2016 consistia num feito quase que impossível, pois esse agendamento era online e aberto diariamente à zero hora de Roma e em poucos segundos se esgotavam as 15 vagas diárias do Consulado de São Paulo. Segundo informações do Consulado, a demanda era de que diariamente quase 5000 pessoas concorriam a essas 15 vagas e conseguia quem fosse mais rápido. Foram dias tensos e montamos uma operação especial aqui em casa pra tentar conseguir uma dessas vagas e às vezes até com 6 aparelhos meus meninos cronometravam os segundos para atualizar o sistema e conseguir uma das 15 vagas diárias... Após 2 ou 3 semanas de tentativas, conseguimos o primeiro agendamento e depois de alguns dias um outro e depois o do meu irmão, que decidiu também fazer o processo conosco e aproveitar a documentação.
Após a legalização dos documentos junto ao consulado italiano, estava tudo pronto para dar entrada no processo de reconhecimento da cidadania italiana, diretamente na Itália. Existe a possibilidade de fazer o processo aqui no Brasil, mas fila de espera é gigantesca, o que tem demorado mais de 10 anos e então nossa decisão foi fazer o processo na Itália.
Para dar entrada diretamente na Itália é necessário ficar lá por um certo tempo, até a residência ser confirmada. Depois disso é solicitada a “Non Renuncia”, que é um documento que atesta que o cidadão italiano não renunciou a cidadania e quem envia esse documento é o consulado italiano no Brasil, da jurisdição onde o cidadão italiano e demais da linha sucessória moravam. Esse documento demora aproximadamente uns 30 dias para chegar e depois disso o requerente já é reconhecido italiano e seus documentos brasileiros são transcritos e já pode fazer a carteira de identidade italiana e também o passaporte.
Com a documentação toda pronta, nosso próximo passo foi escolher um Comune da Itália para estabelecer a residência e dar entrada no processo. É um processo relativamente simples e de poucos gastos (apenas despesas com fotos, 16 euros da marca da bolla e 5 euros para emissão da identidade italiana). A parte mais complicada é conseguir alugar um imóvel na Itália para o período necessário, pois muitos proprietários exigem um contrato mínimo de 1 a 4 anos, além de garantias que um “estrangeiro” ainda não tem como comprovar. Tendo em vista esses detalhes, achamos melhor contratar uma assessoria que providenciasse toda a parte de locação do imóvel, além do acompanhamento do processo. Para nós valeu super a pena, pois conseguimos negociar um preço ótimo, tendo em vista que 4 pessoas da mesma família seriam requerentes. Com tudo acertado, compramos nossas passagens para o mês de janeiro de 2016 e desembarcamos na Itália no dia 19 do referido mês. Fomos eu, minha mãe, meu irmão e meu filho Bruno, já maior de idade. O Vitor também foi, mas não como requerente, pois ele é menor e a minha cidadania saindo se estende a ele também. Meu marido não viajou conosco e nem meu filho Davi, por causa dos vestibulares que estava prestando. No aeroporto de Roma encontramos com a minha irmã que mora no Canadá, que viajou para a Itália para passar esses dias conosco e matar um pouco da saudade.
Na próxima postagem vou relatar sobre nossa temporada na Itália e como transcorreu o processo de reconhecimento da nossa cidadania italiana.


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